segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Mediocridade: uma questão de disputa simbólica



É dever de todo aquele que não compactua com a mediocridade fazer o medíocre sentir vergonha e auto desprezo por querer ser medíocre.

Duas observações quanto a isso:

(1) Note que eu não disse "ser medíocre", mas "QUERER ser medíocre". A diferença reside no fato de haver uma escolha. O medíocre pode sê-lo por condição fisiológica (por exemplo, deficiência cognitiva) ou psicológica (por exemplo, desenvolvimento cognitivo não completo). Em um e outro caso, a escolha não é sua e, por isso, não se deve responsabilizá-lo (se se deve acolhê-lo é outra questão). O medíocre QUER ser medíocre quando tem meios à sua disposição para não sê-lo e opta por sê-lo. É o caso do adulto que opta por ser acomodado, preguiçoso e invejoso do tipo que não quer ser melhor que o invejado, mas somente destruí-lo. Essas três categorias estão para além de qualquer diálogo. E isso me leva à segunda observação.

(2) Note que eu não disse "conversar", nem "conscientizar", mas "fazer sentir vergonha". Isso significa abandonar o diálogo e a tentativa de convencimento, e começar a dar nomes e apontar o dedo na cara. Parece uma atitude violenta e anti-democrática. Violenta eu concordo, mas anti-democrática não é. A democracia é o regime de governo que acolhe a opinião contrária. Mas a opinião contrária só é acolhida quando há um chão de concordância já estabelecido. Isso mesmo: discordância só faz sentido quando já se concordou previamente. Caso contrário, discordância não passa de um emitir de sons dispersos de lado a lado, uns mais ou menos ferozes que os outros. Em resumo: para discordar de mim, você tem que, primeiro, entender o que estou dizendo; esse "primeiro, entender" é o campo da concordância. Sacou?

O medíocre não está disposto à concordância prévia, porque ela demanda "trabalho", e para que o esforço se tudo já está bem como está, né? Dá preguiça melhorar as coisas. Aquele que aponta o meu erro é chato. Aquela que faz o meu trabalho melhor que eu é, na verdade, arrogante e metida.

Medíocres atravancam o trabalho de pessoas de esforço, brio e talento, porque são numerosos e -- fala a verdade -- dá vontade de parar de viver, quando nos deparamos com milhares assim na escola, na universidade, no trabalho e na fila do mercado. Eles nos constrangem a tal ponto de querermos desistir.

Mas isso está errado.

Para retomar a violência que mencionei antes, o que propus só é violento se não considerarmos a verdadeira violência que é ser constrangido diariamente por esse tipo. Onde não é possível o diálogo, é preciso ser violento. Não no sentido de dar porrada: agressão física, danos morais e outras coisas tipificadas no Código Penal e na Constituição Federal. Estou falando aqui de disputa simbólica.

Por disputa simbólica quero dizer a disputa que se dá no âmbito do imaginário popular. Qual modelo de conduta está em jogo quando você se pergunta "Que tipo de pessoa eu elejo para me espelhar?". Ninguém -- eu quero acreditar nisto -- responde "o medíocre, o medíocre!" a essa pergunta. Porém, quando você permanece calado quando o medíocre se manifesta e atravanca o trabalho de alguém que está afim de trabalhar, você está passando uma mensagem muito clara no âmbito simbólico: "O que vale mesmo é ser medíocre, porque quem não é só se fode".

Não vale dar uma de tolerante. A sua tolerância só perpetua a vitória da disputa simbólica para o lado do medíocre. Além do mais, trata-se de uma falsa tolerância, porque no limite você só está se conformando com a presença do tipo e, portanto, sendo tão medíocre quanto ele. "Ah, mas eu quero evitar conflito que é para não ter dor de cabeça". É a mesma desculpa que o medíocre usa para atravancar quem não quer ser medíocre.

É por isso que, para cada acomodado que diz "Isso é assim mesmo", é preciso haver um inconformado para dizer "Assim mesmo é o cacete! Isso pode ser melhor"; para cada preguiçoso que diz "Isso dá muito trabalho", é preciso haver um producente que diga "Que ótimo! Assim eu poderei mostrar o valor que tenho"; para cada invejoso que diga "Nossa, que pessoa arrogante!", é preciso haver um orgulhoso que diga "Eu sou bom e tenho satisfação de sê-lo".

Sejamos chatos. Apontemos o erro. Desprezemos o que deve ser desprezado e valorizemos o que deve ser valorizado. Essa é minha proposta individual, não política, para combater o já tão consolidado no campo simbólico "malandro", "jeitinho brasileiro", "homem cordial", todas versões mais ou menos aplicáveis ao tipo medíocre.

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