domingo, 17 de abril de 2016

Da arte dos grandes à vida dos pequenos



Arte nem sempre foi arte. Explico: a cronologia do termo mostra que nem sempre foi uma questão olhar para um quadro e perguntar: "Há algo de especial nisto?". As perguntas do passado, porém, por mais diferentes da atual, já indicavam a dificuldade de se estabelecer uma fronteira entre a obra criada e sua influência para além da criação.

Os gregos não tinham arte, mas téchne (ofício, habilidade e não expressão estética). Por isso, não havia artista, embora houvesse poesia. Homero servia, ao mesmo tempo, de criação literária e guia de condutas. Sua influência era tal que se tornou inevitável perguntar: deve o poeta ser o guia comportamental de todos?

Platão respondeu que não. E sua resposta baseou-se na premissa de que a fronteira entre invenção e realidade é difícil de se estabelecer -- ao menos da perspectiva da maioria dos homens. Só ao filósofo seria dada, após longo treinamento, a distinção. Por prudência, que o poeta se mantenha afastado.

A modernidade, por sua vez, como assevera Weber, traz a separação das esferas de valor: técnica, arte e moral passam a ser campos distintos, cada um com suas regras próprias. Não faz mas sentido perguntar se Homero retratou ou não Aquiles de forma virtuosa. A pergunta, agora sim, passa a ser: que critérios fazem dos versos homéricos algo passível de apreciação artística?

A resposta nunca foi pacífica, e houve quem dissesse ser impossível separar modo de viver de apreciação de obras de arte. Aliás, em nossos tempos, a pergunta passou a ser outra: para que indagar o que é arte, se os próprios artistas, a cada obra, parecem suspender os critérios anteriores?

Idiossincrasia do artista, critérios universais ou habilidades próprias ao ofício, pensar a arte permite intuir o quanto é difícil apreciá-la e, ao mesmo tempo, despir-se de valores. É difícil comparar influências. Homero nos forma até hoje. Porém, ao menos após o Romantismo, sua hegemonia é ameaçada por outro grande criador: você mesmo, isto é, cada um de nós.

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